Psicóloga Carolina Pinheiro
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30 Jun, 2023 - 10:44

Criança só diz não: a perturbação desafiante de oposição

Psicóloga Carolina Pinheiro

Quando um comportamento desobediente se torna um problema sério está-se perante uma perturbação desafiante de oposição.

Perturbação desafiante de oposição

Os comportamentos desafiadores são uma dificuldade que diariamente pais e professores se deparam. Este comportamento é saudável e típico das crianças nos primeiros anos de vida e tende a passar com a idade. Mas, quando atinge proporções mais graves a situação é mais complexa e estamos perante uma perturbação desafiante de oposição.

“Não quero, não vou, não faço”: comportamentos de oposição

Quando pensamos numa criança desafiadora facilmente nos vem ao pensamento aspetos como “é mal educada, faz birras, não tem regras”. Certo?

Muitos são os pais que lidam com a dificuldade em manter os limites. Muitos acham difícil pensar de forma clara e tranquila nestes momentos e, facilmente, vemos pais e filhos furiosos. Certamente já se deparou com esta situação em casa ou fora dela.

Comportamentos como as birras ou a desobediência podem, para algumas crianças, ter uma “função de vinculação”, na medida que esta será uma forma de ter os pais mais próximos e disponíveis. Noutras pode ser uma dificuldade na capacidade de tolerar e lidar com afetos.

Apesar de uma função adaptativa para a criança, não raras vezes contribuem para um ambiente familiar negativo que poderá culminar, em casos mais graves, numa perturbação desafiante de oposição.

Das birras à perturbação desafiante de oposição

A linha que separa uma birra de uma perturbação desafiante de oposição reside sobretudo ao nível:

  • Da frequência com que ocorre;
  • Da duração – um padrão de humor zangado, irritável, comportamento conflituoso ou desafiante que dure pelo menos 6 meses é sinal de alerta;
  • Da sua gravidade;
  • Dos contextos em que ocorre (casa, escola,…);
  • Do desaparecimento ou não espontâneo durante a fase de desenvolvimento dos 5-6 anos;
  • Da similaridade com crianças da mesma idade e mesmo nível de desenvolvimento.

Características da perturbação desafiante de oposição

perturbação desafiante de oposição: criança a fazer birra
  1. Persistentemente mostra-se zangado, irritável, vingativo.
  2. Frequentemente fica com raiva e/ou ressentimento.
  3. Frequentemente perde o controlo ou fica incomodado com os outros.
  4. Discute frequentemente com os adultos.
  5. Desafia ou recusa com frequência o cumprimento de tarefas ou regras.
  6. Frequentemente aborrece as pessoas.
  7. Culpa os outros pelos seus erros ou mau comportamento.

Estes comportamentos podem ocorrer apenas em um contexto (casa normalmente) ou, em casos mais graves, os sintomas da perturbação estão presentes em vários contexto. Em geral, surgem durante a idade pré-escolar.

Problemas associados à perturbação desafiante de oposição

Crianças e adolescentes com perturbação desafiante de oposição têm risco aumentado para desenvolver:

  • Comportamento antissocial;
  • Problemas de controlo dos impulsos;
  • Abuso de substâncias;
  • Ansiedade;
  • Depressão.

O papel dos pais

De uma forma geral, um padrão de vinculação insegura, conjuntamente com a vivência de situações de adversidade no contexto familiar, pode contribuir para o aparecimento de problemas de comportamento.

A criança aprende a regular as suas emoções na interação precoce com os pais. Se esta, por exemplo, é pautada por uma conduta coerciva, insensibilidade, falta de consistência e de atenção, falta de ordens claras, entre outras, a criança poderá aprender um conjunto rígido e restrito de regras para se relacionar com os outros.

A responsividade e interações afetivas parentais criam a base para a obediência e a internalização dos limites. Na ausência das mesmas, o exercício da disciplina torna-se mais difícil, possivelmente porque a criança está menos preocupada em agradar aos pais, não reconhece os benefícios de uma relação de reciprocidade e não internaliza os valores de um cuidador que a rejeita e não reforça.

A Perturbação desafiante de oposição poderá também surgir como resultado desta última relação.

5 estratégias para lidar com comportamentos desafiantes

bater em criancas para educar diferentes formas

Também como os pequenos, os adultos se “portam mal”: têm vícios que não deveriam ter, chegam atrasados a compromissos, adiam o que têm para fazer, resistem ao que lhes é pedido só porque sim.

Pensar sobre as razões que o levam a portar-se menos bem talvez ajude a perceber as razões pelas quais as crianças desobedecem.

A forma como falamos com as crianças, como colocamos regras e damos instruções tem impacto na sua confiança e responsabilidade. Veja algumas estratégias.

1

Captar a atenção da criança

Pode baixar a voz, colocar-se à altura da criança, olhá-la nos olhos e fazê-la escutar, clarificando a ideia de que tem de parar e de o ouvir naquele momento.

Importa manter sempre a firmeza, sem magoar ou pode afastar-se ou “ameaçar” que se vai embora, ou também pode segurar os ombros da criança, pondo fim à ação.

2

Gestão de atividades

O tempo livre de crianças com esta perturbação deve comportar atividades que lhes deem organização e oportunidade de seguir ordens e trabalhar o espírito de equipa, tal como os escuteiros, um desporto coletivo ou outra atividade que a criança goste.

3

Atitudes firmes e consistentes

Por exemplo, se o seu filho costuma fazer birras mesmo depois de lhe ter explicado como se ia proceder uma saída, retirar a criança do local sem hesitação irá mostrar à criança que quem manda são os pais e não ela o que irá evitar no futuro desafios e provocações em público.

4

Ignorar comportamentos desadequados

Significa que deve ser interrompido o contacto visual e físico, a expressão facial deve ser neutra e não se entra em discussão com a criança até ela mostrar um comportamento desejável.

5

Comunicação

As ordens devem conter o que quer que a criança faça, como o deverá fazer e quando. Seja claro, breve, compreensível e não contraditório

Estas são algumas estratégias eficazes, mas que poderão não resultar para todas as crianças. Se identifica que o problema é mais grave deve recorrer a uma ajuda psicoterapêutica individualizada.

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